Ajuda demais atrapalha

 

 O tema dever de casa ainda não é devidamente pesquisado e analisado. Para que serve? É mais um meio de avaliação? Devem os pais ajudar seus filhos nessa tarefa? Pode ser prescrito pela escola todos os dias? Quando os estudantes têm mais de um professor, como planejar quais deles solicitarão essa tarefa a cada dia? Ou isso não é combinado? As atividades são iguais para todos os estudantes? Na aula seguinte, são analisadas em conjunto, com a participação de todos os estudantes? Essa atividade ocupará quanto tempo da aula? Estas e outras questões merecem análise pelo conjunto dos professores da escola. O texto abaixo lança luz sobre alguns desses aspectos.

O Globo

Ajuda demais atrapalha

por Antônio Gois

14/05/2018 06:00

Novos estudos mostram que a presença excessiva de pais na hora do dever de casa limita a autonomia e prejudica o desempenho dos alunos

No imaginário do que fazem pais zelosos, certamente há a figura da mãe ou pai que diariamente senta ao lado do filho para acompanhá-lo nas lições de casa. Além de ser uma demonstração de valorização dos estudos, a atitude é entendida também como uma oportunidade de ajudar as crianças em tarefas escolares. Um conjunto de estudos recentes, porém, indica que essa prática, a depender de como é executada, pode acabar prejudicando o desenvolvimento do aluno.

O mais recente deles foi publicado na atual edição da revista científica “Learning and Instruction” (Aprendizado e Instrução). Jaana Viljaranta (Universidade da Finlândia Oriental) e outros autores acompanharam por três anos 365 crianças em escolas de ensino fundamental na Finlândia, e investigaram a atitude dos pais no momento da lição de casa. Eles dividiram as famílias em três grupos: aqueles que ajudavam diretamente os filhos no momento do dever, os que apenas monitoravam se a lição havia sido feita e estava correta, e um terceiro grupo que dava total autonomia aos alunos. E depois compararam o desempenho acadêmico dos estudantes e sua capacidade de persistir na realização de tarefas (task-persistent behaviour, em inglês).

Apesar de tratar do contexto finlandês, a conclusão dos autores é consistente com outros estudos realizados em diferentes países. O grupo de estudantes que apresentava menor desempenho e menor capacidade de persistência na realização de tarefas foi o de pais que mais ajudavam as crianças no momento da lição de casa. No caso dos alunos cujos pais apenas monitoravam os deveres, a pesquisa identificou que isso não parecia atrapalhar nem ajudar. E o terceiro grupo, das famílias que deixavam os filhos realizarem as tarefas de forma autônoma, foi o único a apresentar resultados positivos nas dimensões investigadas.

Mesmo tendo sido publicado numa revista científica e de ter conclusões em linha com outras pesquisas sobre o tema, os resultados do estudo não devem ser interpretados a ferro e fogo. Tanto que a principal recomendação que os autores dão ao final do texto não é de simplesmente parar de ajudar os filhos na hora da lição de casa. O que eles sugerem é que os professores orientem os pais sobre as melhores maneiras de apoiar as crianças na realização dessas tarefas.

É preciso também considerar que cada criança tem seu ritmo de aprendizagem. A depender das necessidades e do estágio em que estão, podem precisar de mais ou menos atenção. Há, porém, um alerta importante aos pais: a ajuda pode ser necessária em alguns momentos, mas o ideal é que as crianças tenham a oportunidade de realizar suas tarefas de maneira autônoma, aprendendo também a partir de seus erros, sem que um adulto esteja sempre disponível para dar a resposta certa ou vigiando cada passo da rotina escolar.