Retrocesso pedagógico

Um fato lamentável ocorreu recentemente no Centro Educacional de Ensino 1 da Cidade Estrutural, no DF. Por ser uma instituição militarizada, policiais ali presentes têm extrapolado suas funções. Há cerca de dez dias, ocorreu um desentendimento entre a vice-diretora e um policial militar. Trocaram desaforos, o que ocasionou a exoneração da vice-diretora e a promoção do policial. Tudo começou com uma exposição de cartazes organizada pelos estudantes, no final do ano passado, como parte de estudos sobre a consciência negra. Os policiais não concordaram com os dizeres dos cartazes e exigiram a sua retirada, o que não foi feito.

O controle militar se exacerbou a partir daí, criando insatisfação entre os estudantes. Na semana passada, aos gritos, um policial militar deu voz de prisão a um estudante de 14 anos, como se isso fosse possível. Enfurecido, disse a um deles: “tu não é machão? Vem me ameaçar. Eu te arrebento, moleque”. Quis tomar o celular de outro e, gritando, falou: “você tá preso”. Em meio a forte bate-boca, um estudante perguntou: “vai me prender?” O policial respondeu: “tu que vê?”   São cenas e expressões que não condizem com o trabalho pedagógico de escolas. Os estudantes envolvidos estão sendo formados para desprezar militares, o que é preocupante. Esses profissionais não estão percebendo o ódio que estão disseminando entre os jovens. Os pais, de modo geral, acreditam que, nessas escolas, sob um rígido regime disciplinar, seus filhos estão protegidos e desenvolvendo trabalho sério.  

O caso está tendo ampla repercussão. Os militares foram afastados e a Secretaria de Educação do DF se manifestou dizendo que a parceria com os militares tem dados bons resultados em outras escolas. Mas, não é isso que está em questão. O mau resultado em uma só escola deve ser motivo de preocupação e de revisão dessa política pela SEDF. Por estarem sendo submetidos a situações constrangedoras, os jovens, em processo de formação, estão sendo prejudicados. Aprendizagens não previstas e, de certo modo indesejáveis, estão tendo lugar, proporcionadas por pessoas não afinadas com o trabalho escolar. Durante o período da ditadura, as universidades públicas e particulares tinham estudantes espiões, que não concluíam seus cursos. Estaremos, de alguma forma, revivendo ações daquela época?

Esse acontecimento, que teve vários desdobramentos e envolveu toda a comunidade escolar, deve ter perturbado o processo de aprendizagem. A gestão compartilhada com policiais militares constitui um retrocesso pedagógico, porque infringe os princípios da autonomia, da ética, da liberdade de expressão e da convivência harmoniosa. O seu descumprimento desvia a escola do seu compromisso com a formação de cidadãos críticos e capazes de participar da construção da sociedade em que todos tenham os mesmos direitos.

Todo o grupo que compõe o Centro Educacional de Ensino 1 da Cidade Estrutural precisará de tempo e apoio para refletir e se restabelecer de tão severa agressão. Não nos esqueçamos: tudo o que acontece na escola produz aprendizagens.